As nossas raízes de vinho podem ter a resposta ao que nos vem faltando

Começamos a entender que a nossa identidade de produção, a que foi esquecida e parcialmente abandonada, pode ser a resposta para entregar identidade, diferenciação, carácter e património próprio.

Portugal, sabemos, tem um património vitivinícola muito próprio, que respira identidade e carácter único, ainda assim, a nossa herança de vinho foi em boa parte abandonada, esquecida. Na verdade, foi convertida pela força do consumo moderno, pela globalização do paladar, pela modernização tecnológica do sector e pela alteração do tecido social do país, nos últimos 40 anos.

Por princípio, a ciência, o investimento e a modernização, são vetores de evolução e capacidade de criar mais e melhor, de acrescentar valor pela anulação de fragilidades, ao mesmo tempo que criam capacidade de dominar processos em todas as suas vertentes. Entregam a normalização de procedimentos e removem a componente aleatória dos mesmos.

Portugal vitivinícola, através das suas faculdades, empresas, técnicos, crítica e consumidor, soube (e bem) abraçar toda uma nova capacidade produtiva que nos chegou com identidades globais, identidades criadas em padrões de consumo diferentes, pouco dadas a entender o local. Temos de acrescentar a este processo e momento o êxodo da nossa população, tanto para as grandes cidades como para outras zonas do globo. Com estas saídas removeram-se tradições, conhecimento e cultura das zonas de origem. Ficou assim criado o caldo perfeito para nos irmos esquecendo de nós! Das nossas identidades, das nossas especificidades e do nosso património de cultura de vinho Português.

Porventura, e de alguma forma, passámos por um processo que pareceu ser mais fácil, mais rápido e economicamente mais rentável, começar com uma página (praticamente) em branco do que interpretar esta nova pauta com os nossos próprios instrumentos, com o nosso próprio conhecimento (também válido), com as nossas próprias tradições e metodologias. Entregamos a Vitivinicultura Portuguesa ao gosto global, das novas técnicas, das novas castas e das novas regras de consumo. Assistimos a um crescimento exponencial da indústria do vinho de mesa em Portugal e temos um sector energético, trabalhador, com imensa vontade de sucesso, em que tudo parecia correr bem. Portugal foi-se tornando (e adiando), como a próxima grande coisa, o panorama do vinho à escala global…

Projeto Arribas Wine Company

Nas Arribas do Douro, Frederico Machado e Ricardo Alves dois jovens técnicos, mas já viajados, na procura de diversidade e autenticidade, regressaram a Bemposta, Mogadouro, terra dos avós de um dos fundadores. Nesse local encontraram vinhas muito antigas, algumas voltadas ao abandono devido à idade dos seus proprietários.

Tinta Gorda, Malvasia, Bastardo, Verdelho, Rufete, Bastardo Branco, Verdelho Vermelho, Tinta Serrana, entre outras castas por identificar, vinhas de altitude, grande variedade de solos e exposições, viticultura tradicional e sustentável e vinificação de intervenção mínima são os fios condutores do projeto que procura elevar todo o potencial das Arribas do Douro. Trabalham vinhas em seis aldeias (Peredo de Bemposta, Bemposta, Travanca, Urrós, Sendim e Palaçoulo). Por norma, vinificam separadamente e acabam em 99 por cento dos casos a não misturar aldeias (o que contribui para terem 13-14 referências no mercado a partir de 2023).

Saroto Branco 2021, a cor cheia e o perfil aromático denunciam a maceração pelicular, com aroma de maçã e canela, muito franco e direto. Em boca com bom corpo, largo e sucroso, sem grande acidez, mas muito reativo, pronto a fazer enorme companhia à mesa. Um perfil antigo, que não podia ser mais moderno. Tem um PVP de 9,90 euros.

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Publicado originalmente em: Público

Autor: Hamilton Reis

Leia a notícia na íntegra em: https://www.publico.pt/2023/03/06/terroir/opiniao/raizes-vinho-podem-resposta-vem-faltando-2040899