À descoberta das festas de inverno com a máscara ibérica

À descoberta das festas de inverno com a máscara ibérica

O calendário festivo das Terras de Trás-os-Montes também se faz pela linha de água do Douro-Duero, uma porta que abre o acesso às Festas de Inverno transfronteiriças, pelo lado mágico das máscaras e dos mascarados, que misturam o sagrado e o profano nos 12 dias entre o Natal e os Reis.

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No Nordeste Transmontano as máscaras tomam conta do calendário festivo e os protagonistas são os caretos que saem à rua para expulsar o mal, manifestar a virilidade e dizer que se inicia um novo ciclo, onde tudo se regenera. Sobretudo, saem para fazer a festa.

As celebrações são uma espécie de porta de entrada num mundo de demónios, máscaras e mascarados, tão agrestes e surpreendentes como as arribas do Douro Internacional, cobertas por fragas. Em Miranda do Douro realizam-se ainda a Festa das Morcelas ou da Mocidade, em Constantim, 28 e 29 de dezembro, e a Festa do Menino Jesus de Vila Chã da Braciosa, a 1 de janeiro. Em todas elas o povo requisita figuras assustadoras que transformam rapazes em chocalheiros, caretos e diabos, marcados pela irreverência, que os faz andar pela rua e não deixar ninguém sossegado.

Em menos de duas semanas, a raia é palco de uma imensa recriação de costumes ancestrais, que antigamente eram ritos de passagem dos jovens à idade adulta. “Esta concentração de festas no distrito de Bragança e na província de Zamora é a maior do mundo. Pode acontecer uma festa ou outra, num ou noutro ponto da Europa, mas com esta dimensão, em tão pouco tempo, não se conhece outra”, vinca António Tiza.

Aqui se misturam o sagrado e o profano em festas que andam no limiar da transgressão quase total dos costumes. São instantes da libertinagem mais associada ao Carnaval, mas que nestas terras acontece num período de grande simbolismo como é o Natal. “Vêm do tempo antes de Cristo, mas que a Igreja cristianizou”, destaca Belmiro Ferreira, da Associação Maschocalheiro de Bemposta, em Mogadouro. António Tiza reforça que “a riqueza das máscaras, dos trajes e dos rituais são de uma simbologia extraordinária”.

Enquanto se circula entre festas há muito para desfrutar, como uma visita ao Miradouro da Fraga do Puio, em Picote, Miranda do Douro (aldeia onde existe o Eco-Museu Terra Mater), ou à sala Museu de Arquelogia de Mogadouro. Para pernoitar, na Casa das Quintas, em Quinta das Quebradas, Mogadouro, encontra-se silêncio total para retemperar força para continuar a rota das festividades.

Festa do Chocalheiro ou do Velho

A 25 de dezembro e 1 de janeiro, ou seja, no Natal e no primeiro dia do Ano Novo, um homem (o diabo) vestido com uma espécie de fato de macaco rústico, envergando uma máscara vermelha decorada com chifres, uma serpente (símbolo da fertilidade) e uma salamandra ( associada à mitologia de que é imune ao fogo), com chocalhos à cintura, percorre as ruas da aldeia de Vale de Porco, Mogadouro, a fazer um peditório para o Menino Jesus. Nos bolsos traz cinza que atira aos que encontra. “Os géneros recolhidos são depois leiloados após a missa e o resultado apurado é para a Igreja”, explica Dulcínio Rodrigues, que já vestiu a pele de chocalheiro várias vezes.

Em Mogadouro, faz-se ainda a Festa dos Velhos, em Bruçó, no dia 25 de dezembro, e o Careto de Valverde, também na mesma data.

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O Chocalheiro de Bemposta

Um homem vestido com um mangão (fato negro de burel), o corpo ladeado com uma serpente, usa uma imponente máscara de madeira, negra, enriquecida com elementos como a serpente, salamandra e cornos, onde se espetam duas laranjas, e o queixo em forma de testículo. “Para representar o papel desta figura imponente, que assusta, é preciso ganhar ‘as mandas’, ou seja, um leilão”, diz António Martins, presidente da junta de Bemposta. O chocalheiro sai à rua em Bemposta, Mogadouro, para “recolha da esmola, mas vai assustando quem encontra”, descreveu o autarca.

chocalheiro bruco mogadouro mascara careto

Festa do Chocalheiro ou do Velho

A 25 de dezembro e 1 de janeiro, ou seja, no Natal e no primeiro dia do Ano Novo, um homem (o diabo) vestido com uma espécie de fato de macaco rústico, envergando uma máscara vermelha decorada com chifres, uma serpente (símbolo da fertilidade) e uma salamandra (associada à mitologia de que é imune ao fogo), com chocalhos à cintura, percorre as ruas da aldeia de Vale de Porco, Mogadouro, a fazer um peditório para o Menino Jesus. Nos bolsos traz cinza que atira aos que encontra. “Os géneros recolhidos são depois leiloados após a missa e o resultado apurado é para a Igreja”, explica Dulcínio Rodrigues, que já vestiu a pele de chocalheiro várias vezes.

Em Mogadouro, faz-se ainda a Festa dos Velhos, em Bruçó, no dia 25 de dezembro, e o Careto de Valverde, também na mesma data.

Festa do Menino Jesus

A festa começa na noite de 24 de dezembro, véspera do nascimento do Menino Jesus, quando se acende a fogueira de Natal, e que assim há de continuar até 1 de Janeiro, dia em que o farândulo (ou seja, um homem com um vestido negro e com o rosto pintado de fuligem) sai à rua acompanhado da Sécia (um homem vestido de mulher, com rendas na cabeça), do moço (cuja missão é não deixar o farandolo aproximar-se da Sécia) e do mordomo. Também eles andam em procissão pela aldeia de Tó, pertencente ao município de Mogadouro.

“As personagens podem representar as estações do ano ou a luta entre o bem e o mal”, refere Ricardo Marcos, presidente da junta de Tó.

farandulo de tó

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Saborear o Nordeste com o que da terra nasce

Muitos quilómetros à frente o Lagar do Nicolau, na aldeia de Azinhoso, em Mogadouro, aposta nos genuínos sabores transmontanos. Propriedade da família de Luís Ferreira, o restaurante é um manancial da aconchegante gastronomia do Nordeste no inverno.

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Castelo de Mogadouro

Com construção datada dos alvores do século XII, associada à Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo (Templários), a torre que resta do antigo castelo de Mogadouro, ainda visitável, oferece uma boa vista sobre a vila e os campos agrícolas que a ladeiam até onde o olhar alcança. Esta era uma das fortificações estratégicas da linha de fronteira.

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Transmontanices e o mergulho na região

Esta loja de presentes culturais, localizada no Largo Trindade Coelho, Mogadouro, reúne um conjunto de artigos do mais significativo que Trás-os-Montes dispõe. “Não temos só produtos comestíveis, como compotas, bolos ou chocolates. Temos artesanato, livros de autores transmontanos, instrumentos musicais e muitas outras coisas tradicionais que representam a alma transmontana”, afirma Paulo Carvalho, o proprietário. “Tentamos fazer uma recolha eficaz e representativa da nossa região.”

Publicado originalmente em: Evasões

Jornalista: Glória Lopes

Leia a notícia na íntegra em https://www.evasoes.pt/roteiros/a-descoberta-das-festas-de-inverno-com-a-mascara-iberica/1050912/.